Segundo Bakhtin/Volochinov (apud
MENEGASSI, 2013, p. 105-106) “a palavra é uma espécie de ponte
lançada entre mim e os outros”. O discurso, quando ocorre, não é
mais propriedade exclusiva do autor, pois seu sentido também é
determinado pela interpretação do outro. Dessa forma, um discurso
pode ter sentidos diferentes a depender dos interlocutores que o
recebem e o interpretam. Essa teoria, que repercute no ensino da
escrita na escola, é defendida por Bakhtin e se chama Concepção
Dialógica da Linguagem. Porém, o ensino da produção textual
brasileira já passou por diversas concepções, utilizadas em
diversos períodos históricos. A seguir, será explicada, de forma
resumida, cada uma delas, dando-se maior enfoque, ao final, à teoria
cujo amparo teórico está fundamentado na concepção dialógica de linguagem. De acordo com Menegassi (2013), são conhecidas quatro
concepções de escrita: a) escrita com foco na língua; b) escrita
como dom/inspiração; c) escrita como consequência e c) escrita como
trabalho.
a) A escrita com foco na língua
Essa concepção está
fundamentada na ideia de que um bom escritor redige seu texto sem
erros gramaticais. O professor propõe aos alunos a resolução de
diversos exercícios com a finalidade de que eles internalizem as
regras gramaticais e escrevam seus textos segundo a norma padrão
vigente.
b) A escrita como
dom/inspiração
A partir dessa concepção, os alunos
devem desenvolver suas produções textuais a partir de uma frase ou
comando proposto pelo professor. Não há discussão ou mesmo amparo
teórico prévio para o desenvolvimento do texto. Os alunos escrevem
com base em seus conhecimentos internalizados a respeito do assunto.
Geralmente, essas produções são vistas e não lidas pelo
professor.
c) A escrita como consequência
Essa concepção de escrita é
utilizada geralmente quando o professor retira o aluno do perímetro
escolar ou foge um pouco das atividades desenvolvidas regularmente.
Ocorre quando é transmitido algum vídeo, proposto um passeio para
visitar determinado lugar, desenvolvido um debate, etc. Após a
atividade, o professor solicita a confecção de um relatório, que
também geralmente é visto e não corrigido pelo professor. O
problema dessa concepção é que ela traz a ideia de que a produção
textual é uma penalidade aplicada em razão da atividade motivadora
de interação, dentro ou fora da escola. Além disso, o registro
escrito comprova apenas que o aluno participou da atividade, não
necessariamente que ele a entendeu.
c) A escrita como trabalho
A escrita como trabalho está
amparada na Teoria Dialógica da Linguagem, defendida por Bakhtin.
Para produzir um texto, o aluno deverá passar por um processo:
planejamento, execução do texto escrito, revisão e reescrita.
Assim, a produção textual é um trabalho consciente, planejado,
deliberado e repensado. O aluno deve ter conhecimento sobre: a) o que
vai dizer, ou seja, informar-se sobre o tema; b) saber quem é o
destinatário de sua produção (interlocutor); c) a finalidade do
texto; d) o gênero escolhido e as peculiaridades a ele inerentes,
como, por exemplo, organização composicional e estilo de linguagem.
De acordo com Menegassi (2013, p.
109), essa concepção de escrita é conhecida como “trabalho”
porque dá trabalho, uma vez que o autor precisa preparar, construir,
revisar, reescrever e avaliar um texto. Porém, ela torna a prática
da escrita algo mais completo e eficiente, de modo que “o aluno
possa enfrentar o mundo atual como cidadão participativo, reflexivo
e autônomo, conhecedor de seus direitos e deveres” ( PCN, 1997,
p. 04).
Revisão textual
Feitas essas considerações e
explicado por que a concepção dialógica da escrita como trabalho
deve ser priorizada no contexto escolar, torna-se importante tecer
algumas considerações sobre o papel do professor no momento da
revisão e reescrita das produções textuais de seus alunos.
Menegassi (2013, p. 109), de forma clara e objetiva, traz em seu
artigo diversos apontamentos interessantes sobre como o professor pode corrigir textos de modo a ajudar os discentes no processo de
reescrita.
A importância da revisão e
reescrita no contexto escolar está descrita em dois importantes
documentos: os Parâmetros Curriculares Nacionais da Língua
Portuguesa – PCNs (Brasil, 1997), e as Diretrizes Curriculares da
Educação (Paraná, 2008). Consta nos PCNs que é fundamental
“monitorar todo o processo de produção textual, desde o
planejamento, de tal maneira que o escritor possa coordenar
eficientemente os papeis de produtor, leitor e avaliador do próprio
texto”.
Contudo, conforme explica
Evangelista (apud
MENEGASSI, 2013, p. 113), o professor até “tem boas intenções
sobre o trabalho e sobre a escrita, mas não tem clareza teórica e
metodológica sobre como explicitá-las ao aluno”. Para ajudar o
docente nesse trabalho de revisão e correção de textos, Serafini
(apud
MENEGASSI, 2013, p. 113) ensina importantes princípios:
1) A correção não deve ser
ambígua – é preciso mostrar o erro de forma precisa;
2) Os erros devem ser reagrupados
e catalogados;
3) O aluno deve ser estimulado a
rever as correções feitas, compreendê-las e trabalhar sobre elas;
4) O professor deve estar
pré-disposto a aceitar o texto do aluno – É muito importante que
o professor tenha uma postura aberta e receptiva em relação ao
texto, aceitando sem preconceitos o enfoque, as ideias, o estilo e a
linguagem escolhidos pelo estudante;
5) Devem-se corrigir poucos erros
em cada texto;
6) A correção deve ser adequada
à capacidade do aluno – O estudante muito criticado, cujos textos
vem cheio de correções, sente-se mal a ponto de tornar-se incapaz
de escrever.
Após a correção feita pelo
professor, o aluno pode utilizar quatro operações
linguístico-discursivas para reescrever seu texto: a) Adição ou
acréscimo (acentuação, pontuação, grafema, palavra, frase, etc);
b) Supressão (acentuação, pontuação, grafema, palavra, frase,
etc); c) Substituição (supressão substituída por um termo novo);
Deslocamento (troca de elementos).
As revisões feitas pelo professor
podem ser indicativa, resolutiva, classificatória e interativa. Ruiz
(apud
MENEGASSI, 2013, p. 114) chama atenção sobre a importância desta
última. Por meio dela, o professor pode fazer comentários mais
longos e claros, usando bilhetes no final do texto, de modo a
estabelecer uma maior proximidade e diálogo com o aluno. De forma
simultânea o professor “explica, esclarece, instrui, define regras
que asseguram a competência mínima esperada, modela, monitora,
estimula e elogia o progresso, sempre com um papel crítico e
positivo”. (GARCEZ, 1998; MENEGASSI, 2013)
Por outro lado, a utilização das
outras técnicas, apenas, pode não se mostrar eficiente. Por
exemplo, a revisão por indicação pode gerar ambiguidade, pois o
aluno poderá não entender o que deve ser revisto e agir com descaso
em relação ao apontamento. Já na correção classificatória o
aluno pode não entender os símbolos utilizados pelo professor e
confundir-se. Por fim, na correção resolutiva o aluno não tem a
chance de refletir ou trabalhar sobre seu erro, aceitando a correção
do professor sem o menor esforço.
Além desses apontamentos,
Menegassi (2013) elenca outros cuidados que o professor deve ter no
momento da correção de um texto: a) elogiar o que o aluno fez de
bom, pois isso permite a aproximação entre aluno e professor, além
de incentivar a construção de novos textos; b) utilizar uma
linguagem compatível com a série trabalhada, pois o educador não
pode usar um vocabulário muito formal em séries do ensino
fundamental ou muito simplista em cursos superiores; c) cuidar com a
poluição visual (desordem, flechas cruzando o texto, anotações
longas no meio do texto), pois esse tipo de atitude pode ser
interpretado pelo aluno como uma agressão, como se tudo estivesse
ruim em sua produção; d) fazer seus comentários fora das linhas do
texto, no final das frases ou no pós-texto; e) fazer as correções
resolutivas, como pontuação, ortografia, supressão, acréscimo e
substituição de termos no próprio texto.
A leitura do artigo de Menegassi é
fundamental para os docentes que trabalham com a revisão e reescrita
de produções textuais. Como ingressante no PIBID e aluna do
primeiro ano do curso de Letras, encontrava muita dificuldade no
momento da correção de textos dos alunos, pois não sabia como
deveria identificar o erro, como abordar o aluno para não
desmotivá-lo, como ser clara e objetiva, etc. Com a leitura, discussão e
aprendizado a partir do artigo, o trabalho de correção certamente
será mais eficaz e produtivo.
Referências
BRASIL. MEC. Parâmetros
curriculares nacionais de língua portuguesa.
Terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental.
Brasília: MEC/SEF, 1998.
GARCEZ, L. H. C. A escrita e o
outro: os modos de participação na
construção do texto. Brasília, DF: UNB, 1998.
MENEGASSI, R. J. A revisão de
textos na formação docente inicial. In: GONÇALVES, A. V. (orgs.).
Interação,
gêneros e letramento:
a (re)escrita em foco. Campinas, SP: Pontes Editores, 2013.
RUIZ, E. A correção (o turno do
professor): uma leitura. In: Como se corrige
redação na escola.
Campinas, SP: Mercado das Letras, 2001, p.47-73.
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