sexta-feira, 25 de julho de 2014

Norma (o)culta

Por Flávia Vieira

Há tempos surgiu a crença de que falar bem é sinônimo de falar “certo”. Desde os primórdios da educação essa ideia é “infiltrada” na cabeça de educadores, pais e alunos. 

Aliás, muitos pais almejam que na escola seus filhos aprendam a escrever e falar corretamente. Muitos desses pais imaginam que o ensino de Língua Portuguesa se resuma a esse propósito.

Porém, não vivemos mais nos tempos primórdios e o ensino de Língua Portuguesa evoluiu e muito. Sabemos que é dever da escola oportunizar ao aluno o conhecimento da norma considerada “culta”. Mas como abordar o assunto num país tão variado linguisticamente?

 Possenti (1996) diz o seguinte: “O objetivo da escola é ensinar o português padrão, ou, talvez mais exatamente, o de criar condições para que ele seja aprendido” (p. 17). Portanto, jamais podemos esquecer de que a língua não serve apenas como ferramenta de comunicação, tem toda uma questão cultural e social por trás de cada variedade linguística existente. Variedades que precisam ser respeitadas, falantes que precisam ser respeitados, culturas que merecem ser respeitadas...enfim, língua que deve ser respeitada. 

Irandé Antunes (2007), em seu livro “Muito além da gramática”, nos apresenta as seguintes informações a respeito da norma culta:

“- não implica o uso efetivo em todas as situações de interação verbal, 
- restringe-se a algumas delas, apenas; 
- é uma exigência da comunicação que envolve certo grau de formalidade; não é exigida, por exemplo, nas situações informais da coloquialidade própria da vida privada (aí, alguém pode usá-la, evidentemente, se quiser); 
- está vinculada àqueles grupos sociais que mais diretamente exercem atividades no âmbito da comunicação escrita, sobretudo àqueles grupos ligados à divulgação das informações e ao controle do poder político-administrativo." (op. cit. p. 88)

Podemos concluir que a norma culta é mais requisitada para situações formais, principalmente em atividades que tenham relação com a escrita. O "falante ideal" é aquele que utiliza a adequação linguística, ou seja, não é necessário utilizar a norma considerada culta o tempo todo (até porque seria muito inconveniente).

Dessa forma, percebemos que a tão falada norma “culta” pode ser também uma norma “oculta”, como apresenta Bagno (2003), visto que muitas pessoas, principalmente aquelas que utilizam formas mais estigmatizadas da língua, poderão nunca utilizar essa “tal” de norma. 

Essa questão é muito discutida pelo grupo do Pibid/Português, e nas atividades realizadas nas escolas parceiras procuramos explicar sobre a norma considerada culta e também atentar às variedades e formas mais estigmatizadas da língua. Geralmente, na sala de aula, os alunos tendem a corrigir os colegas, principalmente nas aulas de Língua Portuguesa, e está aí uma ótima oportunidade de o professor iniciar uma discussão acerca do assunto.

Referências
ANTUNES, I. Muito além da gramática. São Paulo: Parábola Editorial, 2007.
BAGNO, M. A norma oculta - língua & poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola Editorial, 2003
POSSENTI, S. Por que (não) ensinar gramática na escola. Campinas: Mercado de Letras, 1996.

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