sexta-feira, 11 de julho de 2014

Reflexões sobre a aula de Língua Portuguesa

Por: Ana Caroline dos Santos

Muitos professores ainda insistem na arcaica visão de ensinar nomenclaturas gramaticais e acreditam que aprender gramática consiste em seguir os moldes pré-estabelecidos, tomados por muitos como verdades irrefutáveis.

Os estudos em Linguística romperam barreiras no sentido de trazer à tona discursos ancorados em pesquisas, afirmando que a gramática precisa sempre ser estudada no texto e que existem diferentes contextos para empregar a língua formal e informal. O modo descontextualizado faz com que os alunos decorem regras e sejam sujeitos passíveis a aceitar sem questionar tudo o que  é imposto, não refletindo sobre a língua que utilizam e muito menos no modo como os sujeitos utilizam a linguagem para atuar sobre seus interlocutores. 

Dessa forma, alguns professores ainda têm a visão de que ensinar a "pura gramática" é "ensinar o indivíduo a escrever", ou mesmo que "quem não usa a gramática normativa não pensa" ou que "a língua é um código que o sujeito deve se apropriar para atingir o sentido que o autor do discurso quis dizer". O ensino nesses moldes tem trazido grandes prejuízos, um deles é fazer com que os indivíduos acreditem que não sabem sua própria língua.

É importante ressaltar, como demonstram Ana Lima, Beth Marcuschi e Cristina Teixeira (2012), que todo falante nativo sabe a gramática de sua língua. Por isso, a gramática normativa, em suas nomenclaturas e prescrições, apresenta contradições. Para elucidarmos, colocamos em voga a classificação ambígua de Sujeito Oculto e Sujeito Indeterminado. Se o sujeito elíptico estiver na primeira pessoa do singular (EU) como em "Estudei muito durante minha vida, mas pouco sei sobre a complexidade das coisas no mundo" ele é classificado como Oculto. E se o sujeito elíptico estiver na terceira pessoa do plural (Eles/Elas) é Indeterminado, como em "Estudaram e logo já não conseguiram aceitar as verdades sem antes questioná-las". Logo, vê-se que tal nomenclatura é ambígua e classifica determinado elemento apenas pela sua forma, que na primeira pessoa do singular se encaixa com uma nomenclatura e na terceira pessoa do plural com outra.

Por meio de muitas pesquisas, os linguistas postularam um viés que permite ao sujeito refletir sobre as línguas que os diversos falantes de um mesmo idioma podem falar. Essa forma de encaminhar as aulas é denominada de Análise Linguística, que é calcada na reflexão sobre o uso e nos efeitos de sentido que uma lacuna textual e uma escolha lexical podem deixar. Nesse viés, é mostrado o valor de determinado vocábulo no texto, no contexto em que foi produzido, em que nada é ingenuamente colocado. Fazer com que os alunos reflitam sobre a língua é elemento-chave para conduzir o sujeito a pensar  nas diferentes intenções por trás das escolhas das palavras e nas diversas formas que o texto é elaborado para atingir esferas sociais diversas. Portanto, como afirmam Lima, A.; Marcuschi, B.; Teixeira, C. (2012),  é essencial estudar a língua em funcionamento, pois  ela não existe  fora do texto.

É crucial fazer os indivíduos pensarem que na linguagem nada é posto de modo inocente, isso propiciará uma melhor compreensão do texto e do que está nas entrelinhas, construindo dessa forma vários significados possíveis para o discurso. Para compreendermos os significados de um texto e extrairmos interpretações presentes nas entrelinhas, devemos saber não somente decodificar os códigos de uma língua, mas precisamos ter o conhecimento de mundo, saber em que momento da história o texto foi produzido e a que público era primordialmente direcionado. 

Com a intenção de explicitar como a língua é operada, tomamos como exemplo o gênero anúncio publicitário, em que o produtor do texto, por meio de um ato comunicativo, tenta persuadir o interlocutor, deixando muitas vezes lacunas para que o leitor preencha, como em "Tomou Doril a dor sumiu". Quem tomou Doril? Nesse caso, o Ele é enunciado pelo sujeito que observou a inteligente ação de alguém e afirma que a pessoa que tomou Doril teve suas dores aliviadas. Esse Ele pode ser qualquer um e se encaixa perfeitamente a um narrador que observa as ações das pessoas e as conta para os outros.

Por fim, enfatizamos que a análise linguística é fundamental para ampliar a competência comunicativa do aluno e fazer com que o sujeito não aceite de modo ingênuo tudo o que é dito, escrito e persuadido, mas que analise cada recurso linguístico empregado no texto, criando a ponte necessária entre o linguístico,  o situacional e o histórico, e assim extraia os muitos efeitos e construções de sentido que um texto pode ter. É com esta visão que encaminhamos as aulas no PIBID-Português.

REFERÊNCIAS:
LIMA,A; MARCUSCHI, B; TEIXEIRA, C. Ensino de gramática e trabalho com textos: atividades compatíveis. In: SILVA, A; PESSOA, A. C; LIMA, A. Ensino de gramática: reflexões sobre a língua portuguesa na escola. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.

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