Por: Lorena Reck Portela Rebesco
Após a propositura
dos projetos de Lei nº 6/2015, 60/2015 e 252/2015 junto à
Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (Alep), muito se tem
ouvido falar sobre previdência. De um lado os servidores públicos
temem ficar sem a sua aposentadoria, de outro a base do governo diz
que a medida é necessária e que não há qualquer risco para os
servidores.
O fato é que o
projeto deveria ter uma discussão mais ampla, até porque a maioria
da população sequer entende muito bem o que é previdência e quais
são os regimes previdenciários existentes no país.
A previdência é um
fundo onde os trabalhadores e empregadores depositam mensalmente uma
quantia. O saldo depositado pode ser utilizado para vários fins, o
mais comum é a aposentadoria por idade, quando os trabalhadores de
uma determinada faixa etária mais avançada já não precisam mais
trabalhar, mas continuam recebendo seus proventos. O fundo arrecadado
também pode ser utilizado para o pagamento de licença maternidade,
auxílio doença, aposentadoria por invalidez etc.
Cada classe de
trabalhadores tem um regime que regulamenta sua previdência. Os
trabalhadores regidos pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho),
em regra, seguem o regime do INSS (Instituto Nacional de Seguridade
Social). Os servidores federais seguem as normas estabelecidas na Lei
8.112/1990. Já os servidores do Paraná obedecem às normas
previstas na Lei 6.174/1970.
Com a falência do
antigo IPE (Instituto de Previdência do Estado) e com a intenção
de melhor administrar a previdência pública do Paraná, em 1998
criou-se a Paranaprevidência, sob a concepção do engenheiro Renato
Follador. Na época os recursos foram repartidos em dois fundos.
O primeiro, chamado
fundo de previdência, ficou responsável por recolher e pagar os
benefícios dos servidores novos, que na época estavam ingressando
no serviço público, e também dos ativos que, na data da publicação
da lei (1998), contavam com até 50 anos, no caso dos homens, e até
45 anos, no caso das mulheres.
Ao segundo,
denominado fundo financeiro, cabia o pagamento dos funcionários
inativos e dos que, embora em atividade, tivessem idade superior a 50
e 45 anos (homens e mulheres, respectivamente).
A referida lei
instituidora da Paranaprevidência também determinou que o saldo do
fundo previdenciário só poderia ser movimentado em 2033, quando,
então, se tornaria auto suficiente. Como este fundo reuniria
servidores mais novos, ainda não aposentados, ele poderia se
capitalizar ao longo dos anos para, no futuro, honrar
o pagamento das aposentadorias com seus próprios recursos.
Enquanto isso, o
fundo financeiro, marcado por um forte déficit, seria mantido com
aportes mensais do governo do Estado até que o último benefício
fosse pago ao último servidor, quando então ocorreria a extinção
desse fundo.
Contudo, o
descontrole na gestão do Estado levou o governador Carlos Alberto
Richa, no início do ano, a tentar reformar a previdência mediante a
propositura dos Projetos de Lei nº 06/2015 e 60/2015. É que com a
crise financeira estadual, não havia dinheiro suficiente para pagar
os servidores que recebiam seus proventos do fundo financeiro
(deficitário). O então projeto visava unir os dois fundos, e os
oito bilhões depositados no fundo previdenciário (superavitário)
poderiam ser utilizados para pagar todos os benefícios dos
servidores do Estado.
Descontentes com a
reforma, os servidores do Paraná saíram às ruas em protesto. No
dia 10/02/2015 os deputados da base aliada, com medo dos funcionários
públicos, tiveram que entrar na Alep em um camburão. Como a votação
do projeto não foi suspensa, manifestantes invadiram a Alep em
10/02/2015 e o restante da categoria entrou em greve.
Invasão da Alep em
10/02/2015
Após intenso
esforço, e com a ajuda do judiciário, firmou-se um acordo, por meio
do qual o governo se comprometeu a deixar a previdência da forma
como estava. E caso viesse a propor um novo projeto de lei sobre a
questão, haveria um amplo debate, com a participação dos
sindicatos, do Ministério Público, do Poder Judiciário e do
Tribunal de Contas.
Contudo, pouco mais
de um mês após a assinatura do referido acordo judicial, a base
aliada do governo apresentou um novo projeto, sob nº 252/2015, a ser
votado pelo regime de urgência, ou seja, o mais rápido possível. O
objetivo era repassar para o fundo previdenciário 33 mil servidores
com 73 anos ou mais. Isso aliviaria o Fundo Financeiro em uns R$ 140
milhões por mês, e o governo economizaria esse dinheiro.
É claro que os
servidores entraram novamente em greve e foram às ruas quando o
projeto estava na iminência de ser votado. Mais uma vez tentou-se
ocupar a Alep, contudo, o governo já havia colocado no Centro Cívico
mais de 1.600 policiais militares, juntamente com a tropa de choque.
O confronto resultou em um massacre, com mais de 230 professores e
estudantes feridos, e na aprovação de um projeto onde não houve a
observância de preceitos constitucionais fundamentais.
Professores e alunos feridos após o massacre do dia 29/05/2015
Durante a
deliberação e votação do projeto, os maiores interessados não
puderam comparecer, de modo que essa omissão violou o artigo 10 da
Constituição Federal, segundo o qual é “assegurada a
participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos
órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou
previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação”.
Além disso, um
projeto dessa complexidade jamais poderia ser votado em regime de
urgência, mas sim pelo procedimento ordinário, respeitando-se a
deliberação, utilização de recursos, emendas e a participação
da população. O regime de urgência é incompatível com o “amplo
debate” assegurado no acordo judicial celebrado após a primeira
greve.
Com relação ao
mérito do projeto, ou seja, para se chegar-se a uma conclusão dos
pontos positivos ou negativos, seria necessário um estudo mais
aprofundado, o que demandaria mais tempo de discussão. A princípio,
o próprio criador da Paraná Previdência, Renato Follador, já
declarou que com a mudança “abandona-se o financiamento por
capitalização, pelo qual haveria recursos para pagar aposentadorias
até a morte de todos os servidores do Fundo Previdenciário. No
lugar, entra o princípio da solvência atuarial: um determinado
número de anos em que haverá recursos para pagar as aposentadorias
daquele grupo (...) com a nova lei esgotará seus recursos em uns 30
anos. O governo usou dinheiro de longo prazo dos servidores para
pagar despesas de curto prazo”.
Renato Follador:
criador da Paraná Previdência
O desfecho desse
conflito é aguardado com muita angústia, não apenas por parte dos
servidores, mas também pelos cidadãos de uma nação que teve seus
princípios constitucionais fundamentais ultrajados e desrespeitados,
princípios estes conquistados com muita luta e a custa de muitas
vidas.
Referências:
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